segunda-feira, 11 de maio de 2015

5 (cinco)




O conto a seguir é a sexta parte de uma sequência de contos intitulada: Zero! Para ler as partes anteriores clique nos link que estão na ordem: 0 (zero), 1 (um), 2 (dois), 3 (três), 4 (quatro)! Boa leitura!




O tempo passou corrido, já era quase madrugada e nada do sujeito aparecer. Livrei-me do pensamento, tentando concentrar-me na minha nova leitura. Estava já no último capítulo. "Não vou esperá-lo" - dizia-me enquanto terminava o livro. Estava no meu antepenúltimo livro, depois só teria os que ele deu-me e então...

Refleti sobre isso por um momento, "Estes serão seus últimos" - disse-me na noite passada acerca dos livros dados. Seria verdade? Não estaria alucinando? Meu fim estaria realmente chegando? Beberiquei meu café e retornei para a história nas folhas agrupadas na minha frente. O que mais podia eu fazer?


Fatos:

   - 1. Se ele não havia chegado ainda era porque, provavelmente, era tudo coisa da minha cabeça mesmo.

   - 2. Algo deveria ser feito a respeito, mas eu detestava médicos, ainda mais psiquiatras.

   - 3. Uma última xícara de café depois do fim do livro e eu iria embora.


O tempo escoou e eu terminei a última página do volume. Fechei-o e pedi meu último café. Oito minutos para as duas da madrugada. Iria mais cedo para casa. Meu café chegou fumegante, soprei-o, provei-o e pousei a xícara no pires. 

"Se eu fosse apostar na causa da sua morte eu diria que seria por causa do excesso de café no seu organismo. Isso com certeza faz mal." - disse a voz melosa e delicada da jovem garotinha sentada na minha frente. 

Tinhas os cabelos lisos e finos e estes escorriam-lhe pelos ombros, loiros como o sol brilhante. Vestia-se simplesmente. Era alva, de pele quase translúcida, e incríveis olhos azuis claros, como os olhos do meu estranho acompanhante misterioso. 

Engoli em seco e estagnei-me.

"Ah!, não vai dizer que não gostou desse aspecto jovial e inocente, vai?!" - perguntou em sua voz angelical.

"Quem é você, mocinha?!" - perguntei timidamente sentindo-me idiota por já ter quase certeza de quem era.

A garotinha gargalhou estridente, como se estivesse rindo forçadamente para coleguinhas da escola. Alguns espectadores olharam desconfiados. Devo citar mais fatos:


   - 1. Era uma garotinha agradável, devo confessar.

   - 2. Garotinhas não andavam sozinhas pela madrugada.

   - 3. Seus olhos eram como os dele, não poderia ser outra pessoa.


"Ora, vamos!" - disse a menina ainda recuperando-se das risadas - "Achei que bem lá no fundo você teria um certo senso de humor."

"O que quer provar com isso?"

"Não quero provar nada, meu caro. Não preciso disso. Gosto de trocar de 'roupa' de vez em quando"

"Isso só faz-me acreditar que..."

"Já sei, já sei! Que chatice, moço!" - interpretou sua personagem, caçoando-me - "Faz você acreditar que eu sou coisa da sua cabeça. Que saco!" - disse mais alto as duas últimas palavras.

"Ok! Você venceu, não falo mais sobre isso." - pausei e retomei - "Você disse ontem que viria no mesmo horário. Está atrasado... quer dizer... atrasada!"

Ele, ou ela, riu de mim. Senti-me envergonhado.

"Eu não queria interromper-lhe a leitura. Esperei que acabasse. Mas cá estou!"

"Achei que estaria matando pessoas demais hoje!" - ironizei e omiti meu real pensamento de que ele não existia.

"Sei!" - respondeu a jovenzinha duvidando de minhas palavras - "Acha mesmo que eu preciso ausentar-me para levar alguém daqui para acolá?"

"Eu pensei que..."

"Acha que ninguém está morrendo neste instante?"

"Como você..."

"Já disse, não sou um ser físico. Não estou aqui e nem lá. Simples assim. Trabalho bem desse jeito."

"Quem fez você?"

"Sempre existi."

"Tem de haver uma origem."

"Sou a origem."

"Como tomou conhecimento de quem era?"

"Sempre fui consciente de quem sou."

"Mas de onde você veio? Como chegou aqui?"

"Da rua, pela porta!" - ridicularizou-me. 

"Sério, responda!" - disse-lhe nervoso.


Fatos:

   - 1. Era confuso e controverso conversar com ele, ela.

   - 2. Não era fácil entender algo que sempre existiu.

   - 3. Era uma garotinha realmente muito graciosa. 


"O que eu poderia dizer-lhe que não parecesse confuso e estranho... hum... deixe-me pensar..."

"Por que as pessoas morrem?"

"Porque foram feitas para ser assim... quer dizer, a maioria foi feita para ser assim."

"Quem as fez ass..." - interrompi minhas palavras e substituí a pergunta - "Como assim? Quem não foi feito para ser assim?"

"Árvores!" - respondeu-me aborrecida e escondendo-me algo - "Não sei quem faz vocês, isso não me importa." - calou-se.

"Sabe, percebo coisas em você." 

"É?! O que percebe em mim?" - disse-me inclinando-se para frente e pondo as mãozinhas inocentes no queixo.

"Você é descontente por ser você. Digo, deve realmente ser desgostoso ser uma... uma... entidade, sei lá, e não saber de quase nada, como a sua própria origem, por exemplo."

Ela, ele, bateu forte com a mão sobre a mesa. Estava realmente nervosa. Fez um beicinho de menina birrenta, mas desfez o bico para dar lugar a uma expressão serena que não condizia com uma garotinha.

"Você é ousado, meu caro!" - disse sorrindo de canto.

"Desculpe se ofendi, só disse o que pensava."

"Você deve estar certo. Mas não diria esse tipo de coisa se vivesse no meu lugar... você faz ideia de como é penoso ser o que eu sou? Tem ideia, alguma ideia, do que é ser eu?!" - ela baixou a cabeça, passou as mãozinhas pelos cabelos e ficou pensativa.

"Olha, não quis ser rude, me desculpe."

"Af! Pare de achar que está falando com uma garotinha real. Arrependo-me de ter vindo assim hoje." - disse indignado.

"Não quis dizer dessa forma, só quis..."

"Tá, tá, já sei, tudo bem." - despachou-me com a mão - "Quer saber?, vou contar o que eu sei, aproveite o que vai ouvir, não costumo contar isso para ninguém, exceto..."

Ela, ele, parou de falar, ainda de cabeça baixa, deixando à mostra seus dourados cabelos. Não quis interromper, senti algo estranho naquele momento. 


   - 1. Minhas dúvidas estavam indo por água abaixo. 

   - 2. Seria possível um ser como a Morte possuir sentimentos?

   - 3. Seria se aquela entidade fosse apenas alguma coisa da minha cabeça, é claro. Mas não precipitei-me, apenas aguardei.


"Houve um rapaz, um homem, mas conheci-o ainda muito jovem, perto do dia do seu fim. Seria um fim bem triste e violento, garanto-lhe. Mas alguma coisa aconteceu, algo inesperado, algo que eu vi acontecer pela primeira vez, algo que eu pude chamar de primeira vez em toda minha sempre existência. Foi inesperado, como eu disse, foi impressionantemente desafiador." - falou-me num completo transe recordativo.

"Esse homem, quebrou as barreiras da vida e da morte, ele superou-se, ele... ainda vive." 

Ouvi e esperei por muito tempo. Como ela não disse mais nada, eu arrisquei perguntar.

"O que tem de tão estranho em alguém estar ainda vivo?" - disse humildemente, não querendo irritá-la.

"Lembra do que eu disse agora há pouco, sobre eu sempre existir? Então, não há um começo, não há um fim, há um agora para mim e mais nada. Só existe o agora, o sempre, e é assim e pronto. Essa é a regra. Mas eu compreendo a sua existência, por exemplo, vejo a sua linearidade, o seu tempo progressivo, ainda que mesmo assim eu não faça parte dele, entende?"

Confirmei com a cabeça mesmo ainda não tendo entendido.

"Sabendo dessa noção de tempo que acontece paralelamente à minha existência, diria que esse homem deveria ter morrido quando eu comecei a existir, ou seja, ele sempre existiu, como eu. Mas eu vi o seu princípio, eu vi seu nascimento, mas até hoje... nunca vi o seu fim."




continua...                  Para ler a próxima parte espere até amanhã!





4 comentários:

  1. Interessante este seu conto! Estou querendo ver o final!!!

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  2. Mais quantas Partes!? Rs
    Ótimo Conton tbm Adoro!
    Que venha o próximo capítulo!

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    1. Legal, Dami, obrigado! Só mais o número de livros que ele tem para ler!

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